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Mulheres denunciam violência obstétrica; saiba se você foi vítima

Essa estranheza é natural. Em um mundo ideal isso deveria ocorrer. Mas o nosso mercado deveria ser um monte de coisas melhores, entre elas menos fantasioso e mais honesto. Entretanto, hoje em dia quem vende a imagem dos serviços de medicina também são pessoas que não são médicas o que cria dores de cabeça para pacientes e médicos enquanto oportunistas fazem a festa.

Conheci duas professoras de faculdade de medicina (pública) especializadas na área de clínica e em uma conversa elas confessaram, uma pra outra, que tinham muito medo de ter que fazer lipoaspiração aqui no país. Tipo... se no meio acadêmico já está assim imagina no meio popular onde aqueles programas de TV de fofoca andam falando demais, apenas dos lucros sociais das cirurgias e não de aptidão. A imagem que focam em passar é que as pessoas ganharam uma Ferrari nova mas não dão espaço o bastante para a pessoa falar que o paciente arrisca a vida só de ficar aberto esperando o médico trabalhar.
Ah, então quando você fala da "pressão do ramo da estética pra banalizar cirurgias" está falando de cirurgias plásticas, né? Porque a cesárea piora a estética, no mínimo deixando uma cicatriz.
 
Também isso e mais que isso (a estética precisa ficar junto com a parte de mídia). A venda de imagem "superpositiva" (com espaço maior apenas para vantagens) contamina a idéia de facilidade que a população tem para com todas as cirurgias e cria um mercado com demanda por baixos padrões.
 
Alguém mais viu isso?

Justiça do RS manda grávida fazer cesariana contra sua vontade
GIOVANNA BALOGH
DE SÃO PAULO

02/04/2014 03h00
Numa medida extrema e possivelmente inédita no país, a Justiça do Rio Grande do Sul determinou que uma mulher grávida de 42 semanas fosse submetida a uma cesariana contra a sua vontade, por considerar que mãe e bebê corriam risco de morte.

O caso aconteceu anteontem em Torres (193 km de Porto Alegre). Após deixar o hospital Nossa Senhora dos Navegantes, contrariando orientação médica, Adelir Carmem Lemos de Goes, 29, foi levada de casa por policiais militares e conduzida à unidade, onde deu à luz uma menina.

A polêmica começou quando a gestante procurou o hospital com dores lombares e no ventre. A médica Andreia Castro examinou a mulher e determinou que ela fosse submetida a uma cesariana, alegando que o bebê estava sentado -o que poderia, segundo a médica, asfixiá-lo durante um parto normal.

Além disso, a médica também argumentou que Adelir já havia feito duas cesarianas anteriormente e que, por essa razão, seu útero poderia se romper no procedimento.

Decidida a fazer o parto normal, a gestante se recusou a ficar no hospital. Alegou que ainda não estava em estágio avançado do trabalho de parto e, após assinar um termo de responsabilidade, voltou para casa.

Reprodução/Facebook
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Adelir de Goes, 29, em fotografia publicada em rede social

A médica, então, decidiu procurar o Ministério Público, que acionou a Justiça. A juíza Liniane Maria Mog da Silva aceitou os argumentos médicos e determinou que a gestante fosse levada para o hospital, com o apoio da polícia, caso fosse necessário.

Stephany Hendz, que é doula (mulher que acompanha e dá suporte a grávidas) de Adelir, diz que durante os exames preliminares foi constatado que o bebê estava saudável e com batimentos cardíacos dentro dos padrões.

"A ideia era ir mais tarde ao hospital para que ela realmente conseguisse ter um parto normal como queria nas outras gestações. Nas outras vezes, ela foi impedida pois a gestação passou de 40 semanas", afirmou Stephany. Uma gestação completa dura entre 37 a 42 semanas.

"No momento em que ela foi examinada, falaram também que o bebê estava pélvico [sentado]. Fizeram um ultrassom, mas não mostraram que o bebê estava realmente sentado", disse a doula.

O pai da criança, o técnico de manutenção Emerson Guimarães, 29, diz que nenhum exame mostrou o bebê virado. "Acho que inventaram só para obrigá-la a ter a cesárea", diz Guimarães.

Stephany conta que a gestante parou de fazer o acompanhamento pré-natal (com 39 semanas de gestação) no posto de saúde com medo de ser induzida a uma cesárea.

O marido afirma que ela estava em trabalho de parto em casa, por volta das 1h30 de ontem, quando um oficial de Justiça bateu na porta da casa da família com a presença de policiais e uma ambulância determinando que ela fosse levada ao hospital.

"Ficamos sem ter como fugir, infelizmente foi uma solução forçada", lamenta o marido de Adelir.

Em nota, o hospital nega que tenha induzido a cesariana. Diz que o acionamento da Promotoria se deu porque mãe e filha corriam "risco iminente de morte".

O bebê nasceu às 3h10 de ontem, com 3,65 kg e 49 centímetros. A mãe e a recém-nascida devem ter alta hoje.

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/cotidi...vida-fazer-cesariana-contra-sua-vontade.shtml
 
tava lendo esse texto aqui >> http://g1.globo.com/bemestar/notici...to-mas-deve-dialogar-dizem-especialistas.html e concordo com a última opinião:

Para o obstetra Alberto Jorge Guimarães, que defende os conceitos de parto humanizado, a decisão sobre a forma como uma criança irá nascer deve levar em consideração tanto o que a mulher sonha para seu parto quanto a avaliação de que essas escolhas podem trazer riscos.

“O médico não pode simplesmente retirar o bebê da mulher, mas pode e deve, com seu conhecimento técnico, deixar claro quais são os possíveis desfechos dessa decisão, que inclusive pode levar ao óbito fetal”, diz Guimarães.

Ele considera que o caso revela a falência do sistema de saúde no que diz respeito à relação de confiança entre médico e paciente. “Quando a situação vai parar na Justiça, acho um extremo do médico e pode ter sido um extremo da mãe também”, diz. “O ideal é que se estabeleça relação de confiança e de respeito. Se a relação for respeitosa, e o papel de cada um estiver bem estabelecido, acho que o desfecho tende a ser de parceria.”

eu acho que nem a médica que a atendeu, e nem a mãe quiseram arredar o pé nos pontos que defendiam. a médica poderia ter esperado um pouco mais e oferecido para ela uma tentativa de parto normal, da mesma forma que a mulher poderia ter entendido que não estava lidando com uma situação normal de opção entre um e outro, ela tinha dois fatores de risco associados. fico com a sensação que rolou um choque de militâncias: de um lado o pessoal pró-vida, do outro o do parto humanizado. extremismo nunca é uma coisa boa (e no final das contas, que bom que mãe e filha passam bem).

mããããs... não deixo de ficar preocupada com os precedentes que essa situação abre. inclusive para todas as mamãezinhas que têm medo de parto normal e "optam" por cesárea: e se o médico falar que oferece risco ao bebê e que TEM QUE fazer normal? chama polícia e força a mãe a ter filho de parto normal? hum? porque em condições normais (bebê encaixado, tudo ok com o útero, tempo de gestação, etc) a cesárea é mais arriscada que o parto normal, e nem por isso tem mãe sendo escoltada pela polícia para fazer parto normal, pelo contrário, cada vez mais e mais mães "optam" pela cesárea.

enfim, ainda acho que desse mato sai cachorro, até porque se você lê o lado do hospital e aí o lado da mãe, percebe que tem várias coisas que não batem. por exemplo, o hospital chegou a alegar que a mãe queria fazer parto em casa, e a mãe diz que só foi para casa para ganhar tempo (voltando para o hospital só quando a criança já estivesse nascendo mesmo). médica disse que o bebê estava em pé, doula garante que estava encaixada (e que não quiseram mostrar a eco que provava que estava em pé). etc. é uma história bem estranha mesmo.

edit: olha, para confirmar o que eu falei sobre a história estar estranha, saiu na folha >> http://www1.folha.uol.com.br/cotidi...firma-mae-forcada-a-fazer-cesarea-no-rs.shtml

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um dos lados tem que estar mentindo, né.
 
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eu acho que nem a médica que a atendeu, e nem a mãe quiseram arredar o pé nos pontos que defendiam. a médica poderia ter esperado um pouco mais e oferecido para ela uma tentativa de parto normal,

Não sei como é que funciona em humanos, mas depois que a criança já está numa determinada posição depois de iniciado o parto natural tem como fazer cesariana no caso de ela, sei lá, trancar?

Meu irmão tinha apresentação pélvica e nasceu de parto normal. Quase morreu e quase levou a mãe junto.
 
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Não sei como é que funciona em humanos, mas depois que a criança já está numa determinada posição depois de iniciado o parto natural tem como fazer cesariana no caso de ela, sei lá, trancar?

Meu irmão tinha apresentação pélvica e nasceu de parto normal. Quase morreu e quase levou a mãe junto.

o negócio é que a mãe diz que não estava em posição pélvica, a médica diz que sim. entende o que quero dizer sobre a história estar estranha? é nisso que eu concordo com a opinião daquele médico: parece ser um caso que mostra como a relação de confiança entre médico e paciente está abalada. porque talvez a médica tenha apresentado eco, explicado os perigos do parto normal mas a mulher encasquetou que todo médico mente para a mulher fazer cesárea, achou que era mentira e decidiu ir pra casa esperar o trabalho de parto evoluir, pensando que se chegasse na maternidade com o bebê já coroando eles não poderiam fazer nada além do parto normal.

eu não quero julgar a mãe, mas tá foda. olha esse trecho da matéria da folha que eu linkei:

Mãe também de um menino de 7 anos e de uma menina de 2, ela afirmou que se sentiu "enganada" por médicos nas gestações anteriores, quando passou por cesáreas.

"Na primeira vez tive cesárea porque não tinha dilatação e na segunda pois estava com 41 semanas de gravidez. Só depois fui saber que não existe indicação real para a cesárea", comenta. Uma gestação completa dura de 37 a 42 semanas

é exatamente o discurso das militantes do parto normal, mas repare numa coisa: é o discurso reproduzido de forma errada, num efeito telefone sem fio. ela diz "Só depois fui saber que não existe indicação real para a cesárea" quando há casos sim em que a cesárea é necessária.

só que, independente da história estar estranha ou não, o fato da justiça ter se metido no meio me deixa com receio. como eu disse, abre precedente e isso pode ser bem ruim. primeiro por acabar com a liberdade de escolha da mãe (como eu disse, imagina mulher que tem pânico de parto normal sendo obrigada a parir assim porque o médico entrou em contato com o mp e disse que cesárea é arriscada?), segundo porque aí sim que vai inflar o número de cesáreas desnecessárias aqui no brasil. mãe quer normal, médico diz que apresenta posição pélvica, pronto, lá vai o juiz manda polícia na casa da mulher.

a situação toda é um pepino só. :|
 
Imaginando o número de mulheres acometidas por depressão pós-parto caso isso se torne uma tendência.
 
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a situação toda é um pepino só. :|
Eu entendi. Só acho que a situação vai ser investigada e os médicos poderão apresentar provas, que serão aceitas ou não e a mãe também poderá se manifestar. Eu entendo que é um baita pepino mesmo e não tiro e nem dou razão previamente para ninguém. Mas também fico pensando que a mãe e a criança estão aí e vivos. Será que estariam se a decisão tomada fosse a de deixar que a situação corresse como a mãe queria, neste caso específico?


O que me deixa triste nesse caso e em outros, e não sei se tu também pensa assim @Ana Lovejoy, é como esses assuntos logo viram um embate entre ativistas pró parto natural e contra parto natural, onde a razão e os motivos de cada um pouco importam. De um lado falta empatia para se colocar na pele da mãe, do outro a mesma falta de empatia para se colocar na pele do médico. E eu vejo isso em tudo, é em discussão sobre estupro ou sobre homossexualidade, sobre crime cometido por crianças, etc. Tá na hora das pessoas serem menos "istas" e mais humanas.
 
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O que me deixa triste nesse caso e em outros, e não sei se tu também pensa assim @Ana Lovejoy, é como esses assuntos logo viram um embate entre ativistas pró parto natural e contra parto natural, onde a razão e os motivos de cada um pouco importam. De um lado falta empatia para se colocar na pele da mãe, do outro a mesma falta de empatia para se colocar na pele do médico. E eu vejo isso em tudo, é em discussão sobre estupro ou sobre homossexualidade, sobre crime cometido por crianças, etc. Tá na hora das pessoas serem menos "istas" e mais humanas.

também acho isso, éomer. eu tenho me punido lido comentários nas notícias sobre o assunto, e a coisa fica mais ou menos assim: ativistas do parto normal sequer tem em mãos os resultados dos exames e já dizem que é tudo mentira, "mais uma cesárea desnecessária", etc. aí quem é de fora começa com "essa mulher só quer chamar atenção", "que ignorante, parir assim quando pode ter cesárea de graça" (??), "se o bebê morresse ia processar o hospital", etc. na real parece que pouca gente está considerando a situação sem puxar sardinha para o próprio lado.

de qualquer forma, eu ainda sinto que da mesma forma que houve um extremismo sobre toda a situação (reccorer à justiça, escolta policial) teve também um pouco de extremismo por parte da doula (e, por influência), da mãe. estava lendo essa matéria aqui >> http://sites.uai.com.br/app/noticia...m-trabalho-de-parto-de-casa-para-obriga.shtml e um trecho chamou minha atenção:

No dia 28 de março, em sua página pessoal no Facebook, a doula Stephany Hendz já demonstrava apreensão e publicou: “Gestante sendo perseguida por se negar a realizar cesárea eletiva. Bebê se movimentando bem, com frequência cardíaca tranquilizadora e mãe com pressão arterial 120x80. Gestação de 41 semanas completas (pelo ultrasson) e posto de saúde ligando (...). A sorte é que o empoderamento não se perde da noite para o dia. Orgulho deste casal que pela terceira vez vai ter que brigar por um parto normal. A única diferença é que dessa vez eles vão conseguir, ah se vão!”.

sabe, fica a sensação de que não importa o que o médico falasse, seria dado como desculpa esfarrapada para "cesárea desnecessária". mas que seja, é como você disse: cada um vai ter a chance de expor seu lado, os médicos terão que mostrar os exames que comprovam que era uma situação de risco.
 
Como se os parâmetros citados fossem indicativo 100% seguro de que um parto vai correr tranquilamente. Meu Deus. Enfim, vou parar de comentar porque hoje tive que ouvir uma maluca dizer "tu não tem filho (no sentido de não poder parir) e não pode dar pitaco. Eu a cada dia descubro que até que sou bem mais educado do que penso, pois não mandei tomar no cu.
 
saindo do assunto da moça de torres (até porque com mais dados ficamos só nos "acho que") notícia antiga (de 2000) mas apareceu na minha timeline, para quem acha que violência obstétrica só acontece no brasil >> http://news.bbc.co.uk/1/hi/world/americas/631568.stm

@Ana Lovejoy, eu acho que nesse caso aí é pura psicopatia mesmo. Esse médico deve completamente tantã.

Verdade, não fica vendo essas coisas não, Ana.
Até eu que não tenho nenhum procedimento médico marcado achei isso impressionante, imagina quem tá gravida. :confused:
 
Hum, eu entendo o que querem dizer, mas evitem falar de pessoas "contra o parto normal". Nenhum médico nega as vantagens dele.

O que eu vou opinar a seguir é defendendo o lado médico, não pela razão óbvia, mas porque as condições eram, sim, indicativas de cesárea.
Essa história da mulher de Torres me pareceu muito birra pra ter parto normal "porque dizem que é melhor". Segundo o Uai, que a Ana compartilhou, a mulher estava com 42 semanas e 2 dias. O tempo de gestação ideal preconizado é de 37 a 42 semanas cravadas; não rola arredondar. A mulher passou do termo (como chamamos o tempo ideal) o feto precisava ser retirado. A médica alegou que tinha mecônio no líquido amniótico. Além disso, bebê em posição pélvica muitas vezes indicará cesárea. Se a mulher já teve vários filhos por via vaginal, parece que o parto normal até rola. Não era o caso dela. Aliás, parto normal depois de duas cesáreas é contra-indicado pelo risco de rotura uterina.

"Mas Tek, disseram que a mãe pediu pra mostrarem o exame mostrando o bebê sentado e o hospital se recusou, e que ela fora informada de que o líquido amniótico estava normal."
Todo paciente tem pleno direito a seus exames e seu prontuário, mas se naquele momento de emergência alguém me pedisse pra mostrar o exame, se a imagem não estivesse impressa e a fácil acesso, eu não ia mostrar, porque se eu perdesse tempo e o prognóstico piorasse, ia sobrar pra mim. Se bem que, na verdade, quando eu fizesse o exame e visse a posição pélvica, eu mostraria pra mãe principalmente pra explicar por que teríamos que recorrer à cesárea... Isso era o certo.
Segundo a notícia postada pelo Bruce, o último pré-natal que ela fez foi na 39ª semana. O bebê não mudaria de posição, então a que ele estava naquela ocasião era a mesma no momento do parto. Ninguém precisa de especulação quando existem provas em algum lugar.
Quanto ao líquido amniótico e batimentos cardíacos fetais, estão registrados no prontuário, que também será analisado.

Eu não teria feito o mesmo. Com um termo de responsabilidade assinado, minha parte está feita.

Não sei como é que funciona em humanos, mas depois que a criança já está numa determinada posição depois de iniciado o parto natural tem como fazer cesariana no caso de ela, sei lá, trancar?
Tinha uma manobra sobre isso (depois olho no caderno de obstetrícia pra ver se anotei o nome), mas é muito arriscada.
 
Hum, eu entendo o que querem dizer, mas evitem falar de pessoas "contra o parto normal". Nenhum médico nega as vantagens dele.

O que eu vou opinar a seguir é defendendo o lado médico, não pela razão óbvia, mas porque as condições eram, sim, indicativas de cesárea.
Essa história da mulher de Torres me pareceu muito birra pra ter parto normal "porque dizem que é melhor". Segundo o Uai, que a Ana compartilhou, a mulher estava com 42 semanas e 2 dias. O tempo de gestação ideal preconizado é de 37 a 42 semanas cravadas; não rola arredondar. A mulher passou do termo (como chamamos o tempo ideal) o feto precisava ser retirado. A médica alegou que tinha mecônio no líquido amniótico. Além disso, bebê em posição pélvica muitas vezes indicará cesárea. Se a mulher já teve vários filhos por via vaginal, parece que o parto normal até rola. Não era o caso dela. Aliás, parto normal depois de duas cesáreas é contra-indicado pelo risco de rotura uterina.

"Mas Tek, disseram que a mãe pediu pra mostrarem o exame mostrando o bebê sentado e o hospital se recusou, e que ela fora informada de que o líquido amniótico estava normal."
Todo paciente tem pleno direito a seus exames e seu prontuário, mas se naquele momento de emergência alguém me pedisse pra mostrar o exame, se a imagem não estivesse impressa e a fácil acesso, eu não ia mostrar, porque se eu perdesse tempo e o prognóstico piorasse, ia sobrar pra mim. Se bem que, na verdade, quando eu fizesse o exame e visse a posição pélvica, eu mostraria pra mãe principalmente pra explicar por que teríamos que recorrer à cesárea... Isso era o certo.
Segundo a notícia postada pelo Bruce, o último pré-natal que ela fez foi na 39ª semana. O bebê não mudaria de posição, então a que ele estava naquela ocasião era a mesma no momento do parto. Ninguém precisa de especulação quando existem provas em algum lugar.
Quanto ao líquido amniótico e batimentos cardíacos fetais, estão registrados no prontuário, que também será analisado.

Eu não teria feito o mesmo. Com um termo de responsabilidade assinado, minha parte está feita.


Tinha uma manobra sobre isso (depois olho no caderno de obstetrícia pra ver se anotei o nome), mas é muito arriscada.

tenho ouvido falar dessa manobra desde que explodiu esse caso. aí por causa da existência dessa manobra, os ativistas do parto normal têm divulgado um mooooonte de textos, videos e afins de mães em situação "similar", meio que tentando provar por outros casos que a mãe de torres poderia ter tentado o parto normal. tinha um que era a mulher contando que mandou o médico ficar só olhando e pariu sozinha um guri (que estava na tal da posição pélvica). ontem vi um video de outra mulher também parindo um bebê em posição pélvica, ali de quatro numa cama, nasceu bonitinho sem problemas. tudo lindo, o milagre da vida, empoderamento, etc. o problema: eu acho que estão esquecendo que cada caso é um caso. a mulher de torres estava em uma situação de risco (pela série de fatores combinados, não era só "x", ou só "y"), mas o que todo mundo deixa de lado e ninguém questiona é: a médica do plantão, estava apta a (ou se sentia apta a) tentar aquela manobra que fazem para inverter a posição da criança antes do parto? estava apta a (ou se sentia apta a) fazer um parto tão arriscado? no video da mulher parindo sozinha tinha pelo menos uns três obstetras ao redor dela. o hospital de torres poderia oferecer isso para a gestante? oferecer segurança para a tentativa de parto normal?

enfim, eu acho que rolou um extremismo. sei que tem médico que faz cesárea sem precisar, sei que tem mãe que consegue mesmo em situação de risco, mas não consigo deixar de pensar: vale a pena? se minha médica chegar amanhã e falar "ana, deu treta por causa de x y e z, teremos que fazer cesárea", eu nem penso duas vezes, vou pra faca mesmo. tem uma diferença entre o questionamento saudável e a teimosia cega.

(mas de novo, enfatizando: não entendo o motivo do contato com a justiça, e não acho que a decisão da justiça tenha sido a mais acertada, inclusive pelo precedente que acaba abrindo. )
 
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E mesmo se você for tentar alguma forma "humanizada", tem que ter acesso fácil a uma emergência, tanto adulta quanto pediátrica.

(mas de novo, enfatizando: não entendo o motivo do contato com a justiça, e não acho que a decisão da justiça tenha sido a mais acertada, inclusive pelo precedente que acaba abrindo. )
Não chegou a ser um caso de atentado à vida de outro ser humano? Assim, eu concordo totalmente com a sua opinião e partilho do seu medo, mas é a única forma de a Justiça justificar a ação.

O problema está exatamente, como você disse, na falta de confiança entre médico e paciente. Muitas pessoas pensam que médico só sugere cesárea porque "é rápida e mais cara", enquanto os médicos devem achar que muitas mulheres querem normal por causa dessa ignorância que vem se propagando. Mas a confiança no profissional está abaladíssima e não só na obstetrícia.
O resultado da investigação dessa história vai ter uma importância muito grande na relação médico-paciente.
 
saiu hoje um resultado de uma pesquisa que sugere que muita mulher muda de ideia sobre o tipo de parto ao longo da gravidez. pesquisa fala também que em hospitais privados o número de cesáreas já está chegando na casa dos 88%. na época saiu um artigo sobre isso, com algumas citações que são meio o que eu acho também:

“Os médicos têm responsabilidade no alto índice de cesarianas, mas não só eles”, diz Maria do Carmo. “Muitas mulheres acham que a cirurgia é um método seguro e confortável. Dá até para programar a data da festa”, afirma. “Elas precisam entender quais são os riscos dessa decisão”.

e

Entre as mulheres que escolheram a cesariana desde o início, a principal razão apontada no estudo foi o medo da dor. “Isso ocorre porque o parto normal oferecido no Brasil ainda é muito ruim”, afirma Maria do Carmo. (...) “No Brasil, colocam um cateter na veia com oxitocina (hormônio que acelera o nascimento) e deixam a pessoa deitada”, afirma a pesquisadora. “É um desrespeito ao corpo, aos sentimentos e à vontade da mulher”. Muitas pedem anestesia porque o parto dói. O SUS oferece esse recurso. O que falta é o anestesista.

***

mas hoje teve notícia boa também:

projeto de lei proposto hoje pelo jean willys >> http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=0F21D9200D087858B9FE16413F258519.proposicoesWeb1?codteor=1257785&filename=PL 7633/2014

e outra notícia boa: Hospital que adotar parto humanizado terá incentivos
 
Sobre a grávida do RS que foi obrigada a fazer cesárea:

Há duas semanas, Adelir Carmen Lemos de Góes recebeu em sua casa, durante a madrugada e estando em trabalho de parto, a visita de um oficial de justiça acompanhado de policiais armados que a forçaram, e ao marido, a acompanhá-los ao hospital para que fosse submetida a uma cesariana contra o seu consentimento. A ordem judicial se baseou na opinião de uma médica, que afirmava que Adelir estaria colocando em risco sua própria vida e a de seu bebê, usando como argumentos o pós-datismo (quando a gestante ultrapassa 42 semanas de gestação), um bebê em posição sentada no útero e o fato de Adelir ter vivido duas cesáreas anteriores. Segundo a médica, ela não teria qualquer condição de viver o parto normal para o qual tanto se preparou, e insistir nesse objetivo traria obrigatoriamente um desfecho fatal.
Durante todos esses dias, muitos profissionais conceituados que atuam na área obstétrica manifestaram-se colocando em cheque a opinião da médica, não apenas baseados em sua opinião pessoal, mas em dados cientificamente comprovados, em suas próprias práticas obstétricas e grande experiência na assistência a partos normais após cesáreas e apresentação pélvica de bebês.
Muitas outras informações também surgiram, como o fato de que o suposto pós-datismo não procedia, uma vez que o exame feito por Adelir na tarde em que esteve no hospital, algumas horas antes de receber a visita do oficial de justiça e dos policiais, indicava gestação absolutamente normal e saudável de 40 semanas.

Nas próximas postagens deste blog, você poderá ler ponderações, explicações ou comentários feitos por médicos, obstetras e obstetrizes, cujos trabalhos em defesa do respeito ao parto e ao nascimento são nacionalmente reconhecidos e respeitados, a respeito tanto da recomendação questionável da cesariana quanto do próprio desfecho em si, marcado por grande violência e desrespeito aos direitos humanos.
Também durante todos esses dias, muito se falou e se agiu a respeito do ocorrido. A Artemis – Aceleradora Social Pela Autonomia Feminina, encaminhou à Secretaria de Justiça e Direitos Humanos da Presidência da República umadenúncia formal sobre a violação dos direitos humanos e a violência obstétrica que marcaram o caso. O Deputado Federal Jean Wyllys acolheu a denúncia encaminhada e em breve haverá uma audiência pública sobre violência obstétrica junto à Comissão de Direitos Humanos e Minorias, em Brasília. Na última sexta-feira, atos de repúdio ao ocorrido e em defesa de Adelir aconteceram em mais de 30 cidades, culminando em uma vigília no Largo São Francisco, em São Paulo. Exatamente neste dia, as Secretarias de Direitos Humanos e de Políticas Para as Mulheres da Presidência da República manifestavam-se formalmente em defesa de Adelir e apoiando a luta contra a violência obstétrica no Brasil. Dezenas de notícias foram veiculadas pela mídia, escrita ou televisiva. Definitivamente, a violência obstétrica ganhou palco para discussão ampla nos coletivos. Finalmente, está-se falando sobre o assunto. Finalmente, a questão foi reconhecida como grave problema social, de saúde e de desrespeito aos direitos humanos e reprodutivos das mulheres.

E tudo isso por que?
É sobre isso que falo hoje.

Tudo isso porque uma mulher de vida simples e pacata, lutando pelo direito de ter seu filho com respeito e orientada, durante a gestação, por profissionais sérios, foi cruelmente desrespeitada e forçada a uma cirurgia sem necessidade, contra sua decisão autônoma.
Durante todos esses dias, dividi-me entre a satisfação de ver o tema acolhido por órgãos e instâncias superiores e uma forte angústia: como Adelir estaria lidando com tudo isso? Como estaria sua vida? O que todo esse movimento, essa discussão, esses holofotes acesos para seu caso, estavam produzindo nela como mulher, como pessoa, em sua família, em sua rotina? Não é possível lutar por direitos humanos e esquecer das pessoas... Não é possível atropelar o sujeito pela causa que ele representa. Cada vez que eu ouvia ou lia comentários absolutamente vazios, desprovidos de qualquer conhecimento sobre o tema, baseados em moralismos ou opiniões pessoais, muitas vezes ofensivos, eu me lembrava de Adelir. E temia pela possibilidade, remota ou não, dela estar sendo novamente violentada, ainda que nossas intenções fossem – e sejam – as melhores.
Então, no sábado, 12 de abril, procurei por ela e seu esposo, Emerson. Ambos prontamente me atenderam ao telefone – ela tendo acabado de tomar um banho e de cuidar da sua bebê, Yuja, então com 12 dias. Perguntei se eles poderiam e gostariam de conversar comigo ou se preferiam que eu os procurasse em outro dia. Emerson me disse: “Hoje é um ótimo dia! Ela está voltando a sorrir. Fez até um bolinho hoje...”.
Então, Adelir e eu conversamos por quase uma hora.

E eu disse a ela que tinha todo o tempo do mundo para ouvi-la, mas que o motivo de tê-la procurado era um só: eu queria saber como ela estava, como estava sua vida, como ela estava emocionalmente, como estava recebendo toda essa movimentação ativista, militante, apaixonada e engajada. Eu estava preparada para ouvir qualquer tipo de resposta, e levar adiante qualquer depoimento dela. Queria saber como estavam as crianças, se havia algo a mais que pudesse ser feito para ajudá-los.

Então, depois de conversarmos um pouco sobre a bebê, depois de saber que Flora – sua segunda filha, que tem hoje 2 aninhos – está apaixonada pela irmãzinha e não quer nem que cheguem perto dela porque só ela quer cuidar, Adelir desabafou:

“Eu não seria nada... Nesse momento, eu não seria nada sem esse apoio. Esse, que vocês todas estão me dando. Eu não seria nada, nós não seríamos nada, porque nem nossa família está nos apoiando. Eu não seria nada... Nosso nome estaria na lama se não fossem vocês”.

Então ela me contou tudo o que eles têm vivido desde então, e um pouco do que viveram no exato dia em que ela foi obrigada a ser operada.

Adelir é mãe de Angelo, Flora e Yuja. Toda a família morava em Canoas, RS, mas se mudaram há dois anos para Torres, também no Rio Grande do Sul. Canoas é uma cidade da região metropolitana de Porto Alegre e tem mais de 400 mil habitantes. Torres tem pouco mais de 30 mil habitantes e fica há mais de 200 km da capital do estado. A família se mudou porque buscava mais tranquilidade para viver e uma qualidade de vida melhor, que de fato encontraram na pequena cidade. Mas depois do que aconteceu com ela, tudo mudou. Hoje, eles são apontados na rua ou ofendidos por pessoas em função do que a grande mídia tem mostrado e em função de suas escolhas. Eles moram numa área rural e levam uma vida simples, e as pessoas da região pouca ou nenhuma informação têm acerca das possibilidades que uma mulher tem para receber o filho que gerou.

Adelir somente agora está encontrando força e coragem para sair com mais frequência, e nos primeiros dias esteve tão abalada emocionalmente que, certa noite, entrou em pânico por ouvir buzinas insistentes em frente à sua casa, achando que alguém poderia invadi-la e atentar contra eles – como de fato viveram dias antes, com a chegada da polícia. Talvez por todo esse abalo emocional, a cicatriz da cirurgia pela qual passou está encontrando dificuldade para cicatrizar e chegou a inflamar. O que trouxe a ela novo medo:

Tudo o que eu não quero é voltar naquele hospital. Não posso nem imaginar o que pode acontecer comigo lá. Nunca mais voltei, mas tenho que voltar em breve para marcar o teste da orelhinha da bebê. Mas estou com muito medo. Eles me maltrataram muito naquele dia, imagine agora que o que fizeram foi revelado e está sendo discutido”.

Desde então, o acompanhamento médico que ela tem recebido vem unicamente do postinho de saúde do seu bairro. E é lá, inclusive, que ela está encontrando talvez o único apoio e fortalecimento em sua própria cidade. Todas as enfermeiras do posto a estão tratando com muito cuidado e amor e sempre se manifestam em sua defesa. Talvez porque, segundo ela mesma contou, muitas já sabiam de outros casos de maus tratos recebidos por outras mulheres na região quando foram dar à luz no mesmo hospital.

Lá eu sou cuidada, sabe? Elas me abraçam, me beijam, perguntam como estou. Elas estão cuidando de mim, não estão me chamando de assassina nem nada. Elas entendem minhas escolhas”.

Pedi a Adelir que contasse como foi que tudo aconteceu durante sua gestação. Sua preparação para o
parto, porquê havia decidido por um parto natural após ter vivido duas cesarianas, quem a tinha apoiado e orientado, como ela tinha conseguido informação.
Adelir viveu uma cesariana no nascimento de seu primeiro filho, Angelo. Ele nasceu em um hospital particular, com pagamento pelo convênio que eles tinham. Com 39 semanas de gestação, o médico não deixou que ela seguisse em frente e marcou a cesárea.

Foi médico particular, né? Aí que eles não deixam passar de 39 mesmo. - disse ela.

Naquela época, ela ainda não tinha ouvido falar ou lido a respeito do parto normal, dos benefícios, das possibilidades. Quando ficou grávida de Flora, chegou a buscar informação. Mas não conseguiu tanto quanto queria por falta de tempo para estudar sobre o assunto. Ela tinha uma lancheria, fazia trufas para gerar renda e trabalhava bastante, fazendo cerca de 60 trufas por dia. Foi na gestação de Flora que ouviu falar pela primeira vez em violência obstétrica e em parto humanizado, mas não conseguiu se aprofundar tanto quanto gostaria. Então, às 41 semanas, o médico que a atendia (e de quem ela gostou muito, por ter sido muito bem tratada e acolhida), afirmou que os batimentos cardíacos da bebê estavam lentos. Adelir chegou a ver em um monitor os batimento cardíacos caindo e, então, consentiu com a cirurgia. Após o nascimento, o médico disse que, por algum procedimento de sutura ter sido feito de maneira não recomendada na primeira cesariana, seria muito arriscado passar por uma terceira. Que se ela engravidasse novamente, talvez buscar outras opções para o nascimento fosse melhor do que viver uma nova cesariana, pois seria muito mais arriscado.

A gravidez de Yuja foi inesperada. Ao se saber grávida, uma das primeiras coisas que Adelir lembrou foi da recomendação do médico sobre o risco de viver uma terceira cesárea. Então, decidiu buscar informação. Buscar alternativas. Eles já viviam em Torres e ela tinha mais tempo disponível, pois não estava trabalhando fora, estava em casa cuidando dos dois filhos pequenos. Então, entrou no Facebook. E lá, encontrou o grupo “Cesárea? Não, obrigada!”. O grupo possui hoje quase 10.000 participantes, mulheres em busca de orientação e profissionais dispostos a oferecê-las. É um grupo ativamente moderado por ativistas, professores, obstetras e obstetrizes conhecidos e engajados na luta contra a epidemia de cesarianas, a violência obstétrica e a medicalização do parto. E foi lá que o estudo de Adelir em busca de um parto normal após suas cesarianas começou.

Foi lá que eu comecei a estudar. Foi quando soube que muitas médicas e outras profissionais estavam quebrando mitos. Elas tinham dados, informações. Foi lá que encontrei a doula que tanto me ajudou”.

Adelir assistiu ao documentário O Renascimento do Parto e se preparou muito para seu parto natural. No final de sua gestação, seu marido, Emerson, fez um acordo com seu empregador e passou a ficar em casa junto com ela, também se preparando para apoiá-la e ajudá-la na hora do parto. Ambos estudaram. Ambos se prepararam. E ela diz que não foi em busca de um parto normal por ser “irresponsável”, como tantos a chamaram. Mas porque tinha medo de morrer em uma cirurgia que, de acordo com o médico anterior, seria muito arriscada. E, também, porque se lembrou muito de seu pai e do que ele a ensinou. Adelir perdeu os pais aos 14 anos e tinha muito medo de que seus próprios filhos ficassem órfãos.

Meu pai era um educador. Ele me ensinou a nunca repetir o que os outros falavam, me ensinou a ir atrás da verdade. Nós não somos papagaios, não podemos só repetir o que dizem por aí, temos que estudar, temos que decidir o que é melhor para a nossa própria vida. Eu nunca descartei uma cesárea! Jamais! Eu só estava em busca de uma opção melhor, mais saudável, para mim e minha filha. Então quando dizem por aí que eu estava colocando meu bebê em risco iminente, é mentira! Não estava! Se um médico me disse que havia um problema com minha cicatriz, eu queria ir atrás de outra opção e encontrei”.

Adelir foi tirada de casa pelos policiais na frente de seu enteado, um garoto de 15 anos, que ficou tremendamente assustado e nervoso, precisando ser amparado pela doula. E a despeito de todo o transtorno e humilhação de ter sido tirada de sua família na madrugada, em trabalho de parto, Adelir diz que isso não foi o pior. Pior que isso foi o que ouviu da médica que fez a cesárea sem seu consentimento:

Enquanto ela me operava, dizia que eu era uma irresponsável, uma assassina, uma louca. Que se eu tivesse marcado a cesárea antes, nada disso precisava ter acontecido. Se eu tivesse marcado a cesárea, meu marido podia estar ali tirando foto agora. Que por minha causa agora eu estava sozinha e ele lá fora. Eles não deixaram meu marido entrar, eu fiquei sozinha...”.

Nesse momento, Emerson interrompeu para dizer o que ele também havia vivido. Ele foi impedido de entrar como acompanhante para o nascimento da filha. Ele acredita que foi impedido porque seria testemunha do que seria feito com a esposa.

Se eles tivessem me deixado entrar, eu ia poder ver se realmente tinha mecônio. Se realmente a bebê estava em sofrimento como ela dizia. Se realmente ela estava sentada e não encaixada como Adelir sentia. Por que não me deixaram entrar? A bebê nasceu bem. E se ela nasceu bem, então ela não estava em sofrimento. Mentiram pra gente. – disse Emerson.

Adelir também falou de seu pré-natal:

Foi ótimo, tudo o que pediram que eu fizesse, eu fiz. Foram 9 consultas, então quando dizem que eu não me cuidei, estão tentando manchar meu nome. Sempre esteve tudo bem com a gestação. Tanto que no exame do dia 31/03 – todo mundo pode ver – estava tudo ótimo com a gente. Batimentos cardíacos ótimos, placenta íntegra, líquido adequado, tudo ótimo. Como que de uma hora pra outra tudo ficou ruim? Só porque eu não quis fazer o que queriam! A única coisa que não batia era isso deles dizerem que eu estava de 42 semanas, porque não batia nas minhas contas. E depois o exame mostrou que eu realmente não estava, estava de 40 semanas”.

Adelir, ao contrário do que as pessoas divulgaram, não é cigana. Emerson é que é descendente de ciganos. Ela é órfã e somente tem contato com os tios. Deles, apenas 1 tio ligou para saber como eles estavam, se precisavam de algo. Seu tio e sua irmã, Talita, foram os únicos da família que a apoiaram. Perderam contato com muitos outros familiares, que não os apoiaram quando o caso chegou à mídia, sequer telefonaram para saber da bebê ou de Adelir. Adelir e Emerson estão chateados e magoados porque gente a quem consideravam muito os estão ofendendo. E quando eu perguntei o que eles esperam com todo esse movimento, ambos responderam juntos:

Uma retratação! A gente quer uma retratação do hospital! Para que as pessoas aqui da nossa comunidade e da nossa família vejam que não estávamos errados e que fomos maltratados”.

Sobre o medo que ela sente de voltar ao hospital, recomendei que ela não vá sozinha, nem somente com o marido. Que alguém de sua confiança os acompanhe, talvez a doula, e que gravem ou filmem com o celular o atendimento que receberem, a fim, quem sabe, de evitar que sejam novamente maltratados.

Por fim, Adelir deixou um recado às mulheres que pretendem engravidar, às que já estão grávidas e às ativistas:

“Eu quero dizer às mulheres que estudem. Que estudem muito. Que busquem informação, toda informação que puderem. Porque a venda de cesárea é muito grande. E eles fazem a gente acreditar que não sabemos de nada. Tenham uma doula, uma doula ajuda muito. Às ativistas eu quero dizer que ‘Obrigada’ é muito pouco, sabe? Eu não tenho palavras pra dizer o que você estão fazendo por mim, por nós. Eu não teria força, meu marido não teria força, se não fossem vocês. Obrigada por nos ajudarem, por estarem do nosso lado. Sem o apoio de vocês eu não seria ninguém agora, depois do que eu passei. Estou conseguindo melhorar porque vocês estão me ajudando. Hoje [1 dia depois do ato nacional] eu consegui até bater um bolinho pra gente! O que eu falo? Falo obrigada! Mas ainda é pouco”.

Essa foi a nossa conversa. Uma conversa sincera, de mãe para mãe, de mãe para pai, de pai para mãe. Entre pessoas fisicamente distantes e tão próximas em nossos ideais. Não sei como isso será possível, mas espero sinceramente que Adelir e Emerson recebam a retratação que esperam e merecem. Isso não vai fazer desaparecer o que ela viveu. A cicatriz de sua terceira cesariana sempre existirá. Mas talvez dê a ela um pouco de paz para seguir com sua família.
De nossa parte, é preciso empatia, acolhimento, compreensão, não julgamento e apoio. Uma família teve toda sua vida alterada em função, apenas, de ter exercido sua liberdade, seu direito à escolha informada e sua autonomia.
Se a nós, cidadãos e cidadãs, for negado esse direito tão básico, o que mais faltará acontecer?
Não somente por isso mas também por isso, somos todxs Adelir. Somos Adelir, Emerson e toda sua família.

http://www.cientistaqueviroumae.com.br/2014/04/uma-conversa-com-adelir-e-emerson-eu.html

E um relato chocante:


Fonte


Fonte

Foi assim que a experiência traumática de parto de uma mulher (uma das mais traumáticas que já li ou ouvi) foi relatada e divulgada pela mídia. Uma mulher reduzida a "surtada comedora de placenta".
O relato e divulgação do caso, nesses termos, no entanto, somente aconteceram após o médico que a atendeu, Iaperi Araújo, ter se referido de maneira degradante, humilhante e ridicularizante à parturiente em sua página na rede social.
Você deve ter ouvido falar sobre esse caso. Aconteceu em Natal, no dia 02 de julho, mas a mídia somente começou seu freak show após a postagem do obstetra. Ex-obstetra, corrijo-me. Porque ele decidiu parar de praticar a obstetrícia.
Pois bem.
Em uma das matérias que menciono acima, há uma entrevista com ele, que conta, sob seu viés, o que considera ter acontecido.
Eu, que estudo a violência obstétrica e as práticas que a constituem, somente lendo sua entrevista (e os prints de sua publicação na rede social), pude identificar o que aconteceu, a motivação, a luta dessa mulher contra a separação mãe-bebê, o preconceito, a desinformação, a má prática, a luta contra a medicalização e a violência institucional e muitos outros pontos que nos dão uma visão aproximada de algo que acontece, infelizmente, ainda muito pouco: a reivindicação explícita dos direitos das mulheres no parto e contra a violência obstétrica. Mas acontece que encontrar mulheres suficientemente empoderadas para tal é evento tão raro que, quando acontece, elas são ridicularizadas e expostas pela mídia como "surtadas", "comedoras de placenta" ou "irresponsáveis que colocam a vida dos filhos em risco e precisam de medidas legais que as acuem e as obriguem a uma cesárea contra sua vontade", como aconteceu com Adelir Carmem Lemos de Góes, em abril deste ano.

Como a mim não interessa outra voz além da dessas mulheres - entre as quais também me incluo - abaixo você vai ler o relato da própria parturiente. Hoje uma mulher vivendo um puerpério extremamente difícil, vítima de bullying, ridicularizada e perseguida em sua própria cidade, cruelmente exposta por uma equipe de saúde e por uma mídia sensacionalista barata.
E por que?
Porque lutou com todas as forças que tinha, e após ser humilhada, ridicularizada e vitimada pela violência obstétrica, que faz centenas de novas vítimas todos os dias, para que não a separassem de seu filho.

Esse é o relato dela.
Absolutamente chocante.
E vai continuar acontecendo. Todos os dias. Com centenas de mulheres.
Até que tenhamos medidas concretas para coibir e punir a má prática que faz, todos os dias, novas vítimas.
Olhe para seu país. Olhe para suas mulheres.
Há violência, mutilação e horror aqui mesmo.
E encarada como normal, ou rotina.


"Sou um animal ferido, que volta destroçado e ensanguentado para o seu ninho, após sobreviver a uma tentativa quase eficaz de abate. Sou um mamífero em apuros, com sua cria no colo, chorando pelo pouco leite que sai das tetas de sua genitora. Eu. Que assustada me escondo de tudo e de todos, pois apesar de ter sobrevivido ao abate, sou agora açoitada e perseguida por meus iguais, mamíferos de mesma ordem, agora robotizados e produzidos por algum processo estranho e sintético, alheio ao processo natural de continuação da espécie, não conhecem o amor, nem o nascimento, nem a maternidade.
[...]
É incrível como na minha cabeça o desenrolar dos fatos e das emoções está cada vez mais claro, nítido, e é cada vez mais surreal a ideia de conseguir escrevê-lo.
[...]
Os flashes não me permitem dormir. O cansaço é infinito, as dores no corpo também são. Meus músculos que aos pouco se recuperam dos últimos dois dias sem dormir, juntamente com o cansaço provocado pelos momentos de tortura no hospital, meus músculos doem, doem tanto que parece que jamais vão sarar. Mas o que me dói mesmo é um canto do meu ser que não sei onde fica, não sei o que é. Sinto apenas uma sensação de vazio na existência. Uma espécie de “rombo” no meu existir, no meu ser, e que me anula por completo, me derruba como nem os meus torturadores conseguiram durante aquelas três horas e meia na sala de parto do Hospital Papi. Penso que o abate moral é um limiar entre eu me suicidar e continuar existindo, me rastejando. Fui abatida? Será que morri? Mataram-me e continuei viva, pelo meu filho que precisava ouvir as batidas do meu coração e foi arrancado violentamente de mim pelas mãos de quem desdenhava de um animal ferido cujo sangue jorrava aos montes, preso a uma mesa da qual não podia sair, pois estavam-lhe arrancando o resto de parto, de vida, que havia nela, sua placenta, tracionada e arrancada brutalmente pelas mãos do obstetra que me atendeu na urgência do hospital. Foi um verdadeiro espetáculo para quem assistiu. Pena que não foi ficção, e alguém ali estava sendo humilhada, moralmente assassinada, fisicamente mutilada, destroçada. Se me mataram, fui então um cadáver vilipendiado.
[...]
Finalmente, exatamente dez dias após o nascimento do meu filhote, estou cá, sentada de frente ao computador, decidida a relatar o que me aconteceu. Foram dez dias de repouso e fortalecimento, mesmo com todas as críticas, com todos os comentários atrozes e as reportagens na mídia me deplorando. Fui chamada de louca, psicopata, disseram que deveriam tirar meu filho de mim (e então ter-me-iam arrancado tudo que restava, e de mim nada mais haveria além de um bolo de carne com um coração pulsante, quando então já não haveria mais o limiar do abate moral, eu já estaria morta). Foram dez dias também de intensificação de todo o sofrimento que me açoita, pois agora eu tenho de lidar com inúmeros telefonemas, mensagens, pessoas perguntando umas às outras se o absurdo da mulher que teria comido placenta, agredido médico e corrido nua por aí tinha sido eu. Infelizmente não comi minha placenta, ainda, pois ainda não tive coragem para encará-la, pegar nela, senti-la, tão cheia de mim, da minha cria, e das emoções que vivenciamos durante nove meses, e nos últimos momentos do meu bebê dentro de mim. Infelizmente também não corri nua, precisei perder alguns minutos me vestindo com roupas sujas e ensanguentadas, pois até panos limpos me foram negados. Pensando bem, eu estava com muito frio, a hemorragia incontida me enfraquecia cada vez mais, acho que foi instintivo parar para me aquecer com aquelas roupas, ainda que sujas e ensanguentadas, aliás, sangue não faria diferença, pois depois que levaram meu filho de mim injustificadamente e manifestamente contra minha vontade para o berçário para lavá-lo com sabão, tirar o vernix protetivo e embrulha-lo com fraldas descartáveis e aquecê-lo artificialmente, desdenhando de meu clamor para tê-lo em meus braços, depois disso eu devo ter lavado com meu sangue o rol da frente do berçário. Perdoe-me quem estiver lendo, os fatos vão e vem, não sei se consigo seguir uma ordem cronológica muito precisa. E por fim, infelizmente não agredi o obstetra. E sequer posso mencionar publicamente o que se passa na minha mente, nesse sentido, por dois motivos: primeiro, eu seria processada, julgada e condenada muito facilmente por algum tipo penal como ameaça, por exemplo. O judiciário não tem pena de foder com quem já está fodido. Segundo, não tenho energias para gastar com isso, preciso me concentrar no meu filhote, que precisa de mim. Se minhas tentativas de afirmar minha autonomia e meu direito de escolha que foram sistematicamente tolhidos e aniquilados durante todo o meu atendimento naquele dia 02 de julho de 2014, se foram agressões, talvez eu o tenha agredido. E ainda assim digo isso em tom de ironia. Imagino que se as minhas tentativas de sobreviver ao massacre foram agressões, o que foi o massacre que me ocorreu naquela sala de parto? Será que um médico famoso de Natal, professor da universidade federal do RN, conhecedor de muitos juízes, promotores, respaldado pelo corporativismo médico, judiciário e elitista da região, será que ele seria sequer processado? Ou algum juiz amigo dele sentaria em cima do processo, ou mesmo enterraria o processo no quintal de casa? O que me resta é escrever um relato. É o substrato da violência patriarcal, machista, corporativista e medicalocêntrica que nos encarcera nesse projeto de civilidade que se nos impõe, rouba de nós mulheres a autonomia, a força, o parto, o nascimento e a maternidade. Uma mulher que pari e sabe a força animal que tem em si é uma grande ameaça a esse sistema, não é mesmo?
[...]
Cheguei no hospital por volta das 20h30... Eu estava a mais de 36 horas em trabalho de parto ativo, bolsa íntegra. Quando subi para o atendimento, ouvi um velho grosseiro me gritando: “Por que não fez pré-natal??”. Eu respondi: "Primeiro, eu fiz pré-natal, mas não trouxe nada comigo, e segundo, o senhor não precisa falar assim comigo, viu?". Ele respondeu que estava falando em tom normal, que não tinha nada a ver, e saiu sorrindo. Eu havia feito todos os exames de sangue, ultrassons, inclusive no dia 01 de julho eu havia feito uma ultra cujo diagnóstico foi excelente, meu líquido estava bom, o bebê encaixado, saudável, maduro. Quando meu pai chegou na sala de atendimento o obstetra foi logo dizendo que não ia me atender, que se precisasse fazer alguma coisa ele não ia fazer, porque estava sozinho, e assim, manifestamente e na presença de todos que comigo estavam, me violentou pela primeira vez, negando-me atendimento. Pedi a meu pai que fossemos embora, pois a coisa não ia funcionar daquele jeito. Mas ele não concordou, estava muito apreensivo, e cansado. Resolvi ficar. Não sabia que estava naquele momento assinando minha sentença de morte. Eu tinha ouvido que eu iria pro quarto. Pensei: tudo bem, eu vou parir no quarto, deve estar pertinho e eu só preciso de um quarto. Mas não tinha leito no Papi, e não me encaminharam para outro hospital. Eu deveria ficar ali mesmo, esperando. Foi então quando o doutor resolveu me examinar. Essa violência foi um pouco mais dolorosa. Ele fez um toque, rompeu minha membrana, gritei de dor. Sua mão saiu de dentro de mim lavada com meu sangue e um pouco da minha integridade, que aos poucos ele terminaria de arrancar de mim nas três horas e meia seguintes. Pedi para ficar nua, e me foi dito que eu não poderia ficar nua, pois naquele hospital eu deveria seguir os protocolos. Consegui ficar apenas com a bata cobrindo-me os peitos. Aceitei a analgesia. Não sabia eu que ali estava o ápice da dominação do meu ser, pois sem sentir as pernas eu não poderia me defender, sair andando, correndo, não poderia mais fugir do massacre, eu me tornaria um animal indefeso. Foram chamar o anestesista. Entre uma contração e outra, que já estavam vindo de minuto em minuto e cada vez mais forte, gritei: "Cadê o filha da puta do anestesista?". No meu tempo ele já estava demorando muito, eu já estava desesperada, e aquilo era meu grito de socorro. Então, ironizando e debochando de mim, o doutor gritou: "Chamem aí o filha da puta do anestesista!". A cada segundo que se passava eu percebia mais o quanto aquilo estava fadado a não dar certo, o cara era um estúpido, e não economizava seus deboches e suas grosserias. Quando ele chegou fui para a sala de parto, onde estava a mesa de parto, o aparato onde eu estaria sendo torturada pelas próximas três horas e meia. Devia ter cerca de um metro de comprimento, por uns 70cm de largura. Imagino que se eu fosse mais larga eu teria me espremido entre os ferros. O anestesista me disse para sentar com os ombros curvados, pedi então que ele aproveitasse entre uma contração e outra, pois eu não conseguiria ficar parada naquela posição durante uma contração. Eu pedia para ele ir logo, mas ele estava muito ocupado falando ao celular.
Depois disso eu tive que deitar em posição de exame ginecológico, a posição da dominação. Eu estava completamente dominada. Perguntei se poderia ficar em outra posição, de quatro, por exemplo, ou de lado, pois me aliviava a dor, e isso me foi de pronto rebatido com “NÃO” por todos os lados. Eu deveria ficar quieta, segurando em dois ferrinhos que tem do lado das pernas na cadeira de parto. Eu não podia sequer por as mãos nas minhas pernas, aliás, minhas tentativas foram todas frustradas, eu teria repetidamente minhas mãos encaminhadas de volta aos ferros da cadeira. Estavam comigo meu pai e Daniel, um amigo clínico geral que havia ido conosco ao hospital. Me diziam para fazer força, empurravam minha barriga, eu fazia força até sentir que ia vomitar. A orientação era essa: quando você achar que não vai aguentar e vai vomitar, pare. O anestesista pressionava meu estômago com seu polegar, era fatal. Vomitei não sei nem quantas vezes, após cada contração, após ter meu estômago pressionado repetidamente. Eu não tinha vomitado ainda, antes de ir pro hospital. Vomitei deitada, quase morri engasgada com meu próprio vômito e ninguém sequer me ajudava a me limpar. Até meu pai e Daniel cederam às ordens autoritárias do obstetra e empurraram minha barriga. Segundo o anestesista, todos deveriam obedecer ao obstetra, pois ele era professor de todos. Eu sofria com a dor dos empurrões e da mão do obstetra dentro da minha vagina. Me senti estuprada.Diziam que era assim mesmo, e que se eu não me concentrasse ia matar meu bebê, que daquele jeito estava difícil, que eu não ia conseguir. Ouvi isso repetidamente durante as três horas e meia em que estive lá. Lembro que eu mantinha em mente sempre que eu não poderia apagar, então controlava a força até um pouco antes do meu limite, com medo de ficar inconsciente e do que poderia vir a me acontecer. Eu estava apavorada, e disposta a tudo para parir meu filho. Eu não iria pra faca, de modo algum eu me submeteria a uma cesárea, ainda com toda aquela oferta. Vi gente entrando e deixando bolsa pessoal na sala de parto, com celular tocando, vi gente entrando com walk-talking ligado. Eu reclamava que tinha muita gente e muito barulho, e que as pessoas não estavam me ajudando. A pediatra, Lívia, disse que aquele parto era uma loucura, que eu era louca, e que tinha que ter aquela equipe toda lá dentro, disse que eu não era ninguém para discutir a necessidade ou não de todas aquelas pessoas ali. Na verdade não entendo porque era tão necessário, pois estavam todos (à exceção do obstetra que me violentava com suas mãos carniceiras e o anestesista que insistia em empurrar minha barriga) apenas observando, gritando comigo, conversando entre si e fazendo da minha vagina aberta e exposta um souvenir de apreciação. Eu implorava, aos prantos, para o obstetra tirar as mãos de dentro de mim, pois ele estava me machucando, me invadindo, e ele repetidamente se negou a me atender, disse-me que se eu tivesse procurado um ginecologista eu não estaria ali atrapalhando a vida dele, disse-me que não estava ali para prestar serviço algum para mim, e que minha vida pouco lhe importava, ele só se importava com o bebê. Quando o bebê nasceu eu percebi que na verdade nem com ele o cara estava preocupado. Ele queria, assim como toda aquela equipe estúpida, que aquilo acabasse logo. Eu chorava, olhava pro meu pai e pedia ajuda, dizia que estava foda pra mim, e ele então pedia ao médico que calasse a boca, pedia a tal da Lívia que se calasse também. Eu disse que não queria que cortassem o cordão umbilical do meu filho, e o obstetra perguntou com base em quê eu dizia aquilo. Respondi que tudo que eu queria estava no meu plano de parto, que estava lá, que ele deveria ver,e que eu dizia aquilo com base na minha autonomia e no meu direito de escolha. Ele respondeu sagazmente que não aceitava plano de parto, e que nunca tinha ouvido falar naquelas coisas não, que lá aquilo não existia. A pediatra Lívia então começou a gritar comigo dizendo que tinha que examinar o bebê, medir, pesar, fazer testes, levar pro berçário, e eu disse que não deixava, ela me gritando e chamando de louca disse que eu não tinha autoridade pra decidir nada sobre o meu filho, eu respondi que o filho era meu e que ninguém o tiraria de mim. Tudo isso entre uma contração e outra. Às vezes a contração passava enquanto eu tentava me defender de toda aquela escoriação moral. Pedi então ao meu pai para que me ajudasse pois eu precisava me focar no trabalho de parto, meu filho estava prestes a nascer. Ele pediu a ela que colaborasse, que não tinha pra que discutir aquelas coisas comigo naquele momento. Ela respondeu que não se calaria, que tinha que falar e que eu tinha que ouvir mesmo. É incrível como eu me impressiono quando lembro do horror que vivi naquela sala. Lembro que quando o doutor fez o toque eu estava com 8 cm de dilatação, ainda não tinha começado o expulsivo. Pouquíssimo tempo depois minha tortura começara, e desde a primeira contração o médico dizia: na próxima ele sai, faça força que ele vai sair, ô Márcio, empurra aí a barriga dela. Dizia: olhe, eu sou muito bom em fórceps, pena que meu equipamento não está aqui. Eu reclamava que ele estava me machucando, que tava doendo, e ele dizia: se você quisesse um parto sem dor faria uma cesárea, quer? Você não quer uma cesárea, ta vendo? Ta reclamando de que? Eu reclamava da luz, do barulho e ele respondia: eu já fiz parto humanizado, com baixa luminosidade, poucas pessoas na sala, mas aqui eu não tenho tempo pra isso não. Foi um horror ouvir aquilo, até eu queria que acabasse logo, mas eu não ia pra faca, e eu não ia ter meu corpo condicionado a uma ocitocina sintética. Eu estava disposta a parir meu bebê, a qualquer custo, ainda que me estivesse custando a integridade moral e física. No finalzinho do processo a bolsa rompeu. O médico ouviu o coração do bebê, estava 130 bpm. O líquido estava límpido.Mas eu ouvia que o bebê estava em sofrimento. Imagino que presenciando toda aquela tortura, todo aquele tratamento desumano e degradante, meu bebê realmente estivesse sofrendo, mas em sofrimento fetal ele não estava. Eu sabia que estava tudo bem com ele. Eis que então o líquido começou a se apresentar meconioso, mas de toda forma, para que se comprovasse o sofrimento fetal ele deveria ao menos ouvir novamente o coração do bebê, mas quando indagado sobre tal, o obstetra respondeu que não iria mais ouvir, já tinha ouvido uma vez (antes da rutura da bolsa). Quando o líquido mudou de cor toda a pressão psicológica se intensificou. E então, coagida a aceitar, sob pena de “matar meu bebê”, cedi a uma episiotomia, que segundo o médico seria só um cortezinho pequenininho. Meu pai disse que ele cortou com a tesoura e terminou de rasgar com a mão. Há uns dois dias tive coragem de me ver, e descobri uma episiotomia que me rasgou até o anus, e que me dói para sentar, para andar, dói muito na hora de ir no banheiro, mas a dor maior que eu sinto é na alma. Nem sei se um dia vou ter coragem de abrir as pernas de novo.
Meu bebê então nasceu, veio para o meu colo, todo lindo, roxinho, cheio de mecônio, respirando bem e chorando bravamente!!!! Viva! Eu havia conseguido!!! Eu e ele havíamos conseguido! Nosso pesadelo acabaria! Enquanto eu tentava dizer a todo mundo que ele tava bem, tava respirando, tava chorando, e que precisava ficar comigo. Disseram o obstetra e a pediatra que tinham de cortar o cordão senão o sangue voltaria e o bebê perderia sangue. Meu pai então recebeu das mãos do obstetra uma tesoura e cortou o cordão. Enquanto isso a pediatra Lívia estribuchava querendo arrancá-lo de mim, pois precisava examiná-lo, ver o que era aquela bossa na cabeça dele (por certo ela não sabe nada de parto normal, de bebês que de fato nascem, em vez de serem arrancados de suas mãos pela barriga, por certo ela não sabe que bossa é comum e não é problema algum, por certo ela também não sabe que não precisa aspirar o bebê, mesmo com presença de mecônio, desde que o bebê esteja respirando bem, e mais certo ainda que ela não sabe do meu direito de decidir sobre isso). Mas ninguém me ouviu. Sob tal terror dessa médica inescrupulosa, meu pai me olhou e disse: "Entregue o bebê senão eu vou embora". Daniel, com cara de apavorado, corroborou a fala do meu pai. Nessa hora tive medo de ficar sozinha e ser por fim trucidada e aniquilada, e aos prantos entreguei meu bebê para que fosse examinado na sala de parto. Pegaram ele que nem uma trouxa de panos e o aspiraram. De nada adiantou o pacto com meu pai, pois ele ainda assim se foi. Saiu para buscar um pote para a placenta. Nessa hora olhei e vi o obstetra puxando minha placenta, o anestesista preparando uma injeção anti-hemorrágica e uma pessoa de bata azul cinicamente levando meu bebê para o berçário enquanto eu gritava para ele não ir. Desde o primeiro momento eu havia confiado a Daniel a tarefa de não deixar levá-lo, mas ele também cedeu. Essa talvez seja a parte que mais me dói. Quando minha placenta saiu eu gritei: "A placenta é minha!". O médico ia jogá-la no lixo. Ele ainda ironizou querendo me apresentar à minha placenta, mas nessa hora eu só pensava em ir buscar meu filho. Pedi panos limpos, e me negaram. Pedi uma escada para descer da mesa. Negaram-me. O anestesista olhou pra mim e disse: "Mas você não pode andar, não sente suas pernas". Bati com força na minha panturrilha, dei vários tapas, com força, queria sentir o sangue circular, bati nas pernas dizendo que podia sim andar, e que se não me dessem uma escada eu ia pular dali, sangrando como estava, jorrando sangue.
Eu era um animal ferido, mutilado, ensanguentado, que teve sua cria tomada. Eu estava transtornada. Queria sair dali e me recolher, eu precisava me proteger, eu iria morrer sangrando ali, ninguém me daria meu filho para que ele pudesse mamar e estancar a hemorragia. Tentaram me impedir de sair da sala de parto, pois eu estava nua. Foi então que me deram meus trapos sujos de sangue, vesti ali no corredor mesmo, e fiquei gritando na frente do berçário, de portas trancadas, gritando que queria meu filho comigo. Foi o ápice do espetáculo. Um ser abatido, lutando para ter sua cria de volta, e uma plateia imensa e inerte assistindo, me dizendo para tomar banho, me limpar, e então eu poderia ver meu filho, pois eu estava desequilibrada e ele não era propriedade minha. Eu não vou nem mencionar o quanto eu queria exterminar cada uma daquelas pessoas que se interpunham entre mim e meu filho, mas eu estava muito fraca, perdendo muito sangue.
Foi então que meu pai, que havia saído, voltou e me ouviu gritando, desesperada. Quando ele chegou à porta do berçário gritou dizendo que queria o bebê, e como resposta teve apenas o desdém de todos. Foi preciso ele ameaçar arrombar a porta para que resolvessem sensatamente entregar meu filho (a ele). Finalmente pude ter meu filho nos braços.
O que me foi arrancado jamais terei de volta.
Foi o dia mais pavoroso da minha vida.
Espero um dia poder fechar os olhos para dormir em paz, sem que os ecos dessa tortura me atormentem.
[...]
Não consigo mais remoer os fatos, escrever esse relato me trouxe à exaustão".

http://www.cientistaqueviroumae.com.br/2014/07/nao-ela-nao-e-uma-comedora-de-placenta.html
 

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